José deu início a uma espécie de palestra. Nem parecia incipiente nesses assuntos, a fonte jorrava a gorgolejos estentóreos, modulava sua voz segundo regras –– inconscientes –– da mais fina oratória. Semeou a dúvida nas entranhas do globo. Fez apologia da hesitação e da vanidade de todo e qualquer ato. Engrandeceu a inutilidade como principal atributo do homem. Impregnou a matéria com incertezas. Esclareceu à turba que todos estão fadados ao fracasso, e que melhor seria não ter nascido. Disse que a infelicidade e a desgraça estão inscritas de modo indelével nos abismos de cada célula humana; que é impossível conhecer a si próprio, pois estamos envoltos em brumosos abismos e dobras que são inextricáveis. Amor e felicidade são palavras vazias de significado, e o homem é um cadáver que se arrasta sob o sol. Por fim, rogou que construíssemos templos à Ruína, e que entoássemos ladainhas à glória dos natimortos.
(Meu amigo André, Desgraça)