quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Ler devia ser proibido


(Adaptação do texto de Guiomar de Grammont)

Refutações cínicas

Diógenes deu a seguinte resposta a alguém que sustentava que não existe o movimento: levantou-se e começou a andar. A outra pessoa, que dissertava sobre os fenômenos celestes, Diógenes perguntou: "Há quantos dias chegaste do céu?".

Platão definira o homem como um animal bípede, sem asas, e recebeu aplausos; Diógenes depenou um galo e o levou ao local das aulas, exclamando: "Eis o homem de Platão!".

A alguém que lhe disse: "És velho, repousa!", Diógenes respondeu: "Como? Se estivesse correndo num estádio, eu deveria diminuir o ritmo ao me aproximar da chegada? Ao contrário, deveria aumentar a velocidade".

Quando alguém o reprovou por seu exílio, sua resposta foi: "Mas me dediquei à filosofia por causa disso, infeliz". Dizendo outra pessoa que o povo de Sinope o condenara ao exílio, Diógenes replicou: "E eu o condenei a permanecer onde estava".

Ouvindo uma preleção de Platão sobre as ideias, na qual esse filósofo se referia a nomes como "mesidade" e "tacidade", Diógenes ponderou: "A mesa e a taça eu vejo, Platão, porém tua mesidade e tacidade não posso ver de forma alguma".

(Diógenes Laércio)

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Sinceridade cínica

Conta Hecáton no primeiro livro de suas Sentenças que, certa vez, Diógenes gritou: "Atenção, homens!", e, quando muita gente acorreu, ele brandiu o seu bastão dizendo: "Chamei homens, não canalhas!".


(Diógenes Laércio)

domingo, 25 de dezembro de 2011

Discurso acerca daquilo que não é

Em certo ponto de sua obra, Hume descreve o modo pelo qual podemos saber se um termo tem ou não significação, isto é, se há ou não uma ideia a ele anexa. Apliquemos, pois, esse teste da linguagem com um termo bastante específico: "verdade". Há uma ideia de verdade? Certamente não nos deparamos com a verdade no campo empírico (podemos, no máximo, falar de fatos, mas nunca de verdade). Então a verdade é uma ficção? Se assim fosse, seria necessário uma certa base a partir da qual ser-nos-ia possível, por meio de abstrações, construí-la na imaginação. Há essa base? Olhai de perto o fundamento de todas as relações humanas e facilmente a encontrareis. A verdade é o resultado de uma abstrata enrolação.

(Eu mesmo)

sábado, 24 de dezembro de 2011

Sabedoria murphyana

A probabilidade do pão cair com o lado da manteiga virado para baixo é proporcional ao valor do carpete. O gato sempre cai em pé. Não adianta tentar enganar a lei natural das coisas amarrando o pão com manteiga nas costas do gato para, em seguida, jogá-lo no carpete. Provavelmente o gato comerá o pão antes de cair... em pé.

(Murphy e Eu mesmo)

Concluindo...

Concluir não é senão se cansar de pensar.

(Eu mesmo)

Nossa vida não é o esboço de nada

Tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio já é a própria vida? É isso que faz com que a vida pareça sempre um esboço. No entanto, mesmo "esboço" não é a palavra certa, porque um esboço é sempre um projeto de alguma coisa, a preparação de um quadro, ao passo que o esboço que é a nossa vida não é o esboço de nada, é um esboço sem quadro.

(Milan Kundera, A insustentável leveza do ser)

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Sobre a composição do saber

A forma do conhecimento é a enrolação. A matéria, qualquer coisa.

(Eu mesmo)

Os ciclos

Não terás paz na terra, e é tolice acreditar
no repouso eterno. Depois da morte
teu sono será breve: renascerás na erva
que será pisada, ou na flor que murchará.

(Omar Khayyam)

O conhecimento segue o caminho da insensatez

Toda tentativa de destruir um sistema qualquer a partir da proposta de um outro é vã, mesmo que se suponha ser melhor a nova proposta. Sensatos são aqueles que não propõem nada. 

(Eu mesmo)

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Vilegiatura

O sossego da noite, na vilegiatura no alto;
O sossego, que mais aprofunda
O ladrar esparso dos cães de guarda da noite;
O silêncio, que mais se acentua, 
Porque zumbe ou murmura uma coisa nenhuma no escuro...
Ah, a opressão de tudo isso!
Oprime como ser feliz!
Que vida idílica, se fosse outra pessoa que a tivesse
Com o zumbido ou murmúrio monótono de nada
Sob o céu sardento de estrelas, 
Com o ladrar dos cães polvilhando o sossego de tudo!

Vim aqui para repousar, 
Mas esqueci-me de me deixar lá em casa,
Trouxe comigo o espinho essencial de ser consciente,
A vaga náusea, a doença incerta, de me sentir.

(Fernando Pessoa)

A consciência da infelicidade

Não há nas farmácias nada específico contra a existência; somente pequenos remédios para os arrogantes. Mas onde está o antídoto do desespero claro, infinitamente articulado, orgulhoso e seguro? Todos os seres são infelizes; quantos, porém, o sabem? A consciência da infelicidade é uma enfermidade grave demais para figurar em uma aritmética das agonias ou nos registros do incurável.

(Emil Cioran)

Quem governa?

Um dia as árvores se puseram a caminho
para ungir um rei que reinasse sobre elas.
Disseram às oliveiras: "Reina sobre nós!"

A oliveira lhes respondeu:
"Renunciaria eu ao meu azeite,
que tanto honra aos deuses como aos homens,
a fim de balançar-me por sobre as árvores?"

Então as árvores disseram à figueira:
"Vem tu, e reina sobre nós!"

A figueira lhes respondeu:
"Iria eu abandonar minha doçura
e o meu saboroso fruto,
a fim de balançar-me por sobre as árvores?"

As árvores disseram então à videira:
"Vem tu, e reina sobre nós!"

A videira lhes respondeu:
"Iria eu abandonar meu vinho novo,
que alegra aos deuses e aos homens,
a fim de balançar-me por sobre as árvores?"

Então todas as árvores disseram ao espinheiro:
"Vem tu, e reina sobre nós!"

E o espinheiro respondeu às árvores:
"Se é de boa fé que me ungis como rei sobre vós,
vinde e abrigai-vos à minha sombra.
Se não, sairá fogo dos espinheiros
e devorará os cedros do Líbano!"

(Juízes 9, 8-15)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Acostumados à coisa em si

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e do que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagará mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.

(Mariana Colasanti)

sábado, 3 de dezembro de 2011

Argumento ornitológico para a existência de Deus

Eu fecho os olhos e vejo um bando de pássaros. A visão dura um segundo ou talvez menos; não sei quantos pássaros vi. Era definido ou indefinido o seu número? O problema envolve o da existência de Deus. Se Deus existe, o número é definido, porque Deus sabe quantos pássaros eu vi. Se Deus não existe, o número é indefinido, porque ninguém pode fazer a conta. Eu tenho certeza de que vi menos de dez pássaros e mais de um, mas não vi nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três ou dois pássaros. Eu vi um número entre dez e um, que não é nove, oito, sete, seis, etc. Esse número é inconcebível, mas é inteiro. Minha opinião ornitológica, Deus existe.

(Jorge Luís Borges)

Fim de papo

What is mind? No matter.
What is matter? Never mind.

(Berkeley)

Pensamento x linguagem

Há duas situações interessantes: quando o pensamento anda mais rápido que a língua e quando a língua anda mais rápido que o pensamento. Qual é o pior? O pior é quando o pensamento e a linguagem andam na mesma marcha. Aí começa o tédio!

(Jean Baudrillard)

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Expressões contraditórias

1) Ação moral.
2) Pedagogia libertadora.
3) Conhecimento absoluto.
4) Saber verdadeiro.
5) Problema solucionável.

(Eu mesmo)