segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Vontade cega

Com frequência não sabemos o que desejamos ou o que tememos. Podemos por anos a fio nutrir um desejo sem admiti-lo e nem sequer deixá-lo aparecer na clara consciência porque o intelecto nada deve saber acerca dele; pois a boa opinião que temos sobre nós mesmos sofreria um abalo: no entanto, se o desejo é satisfeito, sentimos com alegria e não sem uma certa vergonha que de fato era isso o que desejávamos: por exemplo, a morte de um parente próximo do qual somos herdeiros. Às vezes, não sabemos o que realmente tememos já que nos falta coragem de trazê-lo à clara consciência. De fato, com frequência estamos completamente enganados sobre o real motivo que nos leva a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, até que finalmente um acaso revela-nos o mistério e reconhecemos que o real motivo não era o que tomávamos como tal, mas um outro que éramos incapazes de admitir visto que não corresponde de modo algum à boa opinião que temos de nós mesmos. Por exemplo, deixamos de fazer algo por razões puramente morais, pelo menos assim acreditamos; mas depois notamos que foi o puro medo o que nos deteve, pois fazemos tal coisa assim que qualquer perigo é removido. Em determinados casos isso pode ir tão longe que uma pessoa não suspeita qual seja o motivo propriamente dito de sua ação, sim, não considera a si mesma como capaz de ser movida por um semelhante motivo: todavia, é justamente esse o real motivo de sua ação.

(Schopenhauer, O mundo como vontade e como representação)

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